domingo, 15 de abril de 2018

Por que mataram Jesus? Por que Jesus morreu? (Parte III)


Nas postagens anteriores tratamos da questão “por que mataram Jesus?”. Responder a essa questão é relativamente fácil, pois podemos recorrer ao contexto histórico, à pesquisa sobre Jesus e aos elementos presentes nos Evangelhos que nos permitem ver, mais explicitamente, todo o conjunto de fatores sociais, político e religiosos que desembocaram em sua morte.
Entretanto, a outra questão é um pouco mais delicada, pois por trás dela está um dado da fé dos primeiros cristãos que se refere à identidade de Jesus. O anúncio das protocomunidades cristãs afirmava que Jesus era o messias, Filho de Deus. Isso gerou uma problemática que era a seguinte: se ele é o Filho de Deus por que ele morreu crucificado? Qual a razão da sua morte?[1]
Pode parecer bobagem, mas alguém que foi enviado por Deus, morrer assim, não fazia sentido. “Deus não estava com ele?” Sua morte trágica soaria como um atestado de que ele não era o enviado de Deus, que ele seria um impostor, pois Deus o abandonou na cruz.
Para enfrentar essa questão, os primeiros cristãos precisaram desenvolver uma reflexão que os ajudassem a entender o sentido da morte de Jesus. Vamos fazer juntos esse caminho, mesmo que de forma breve.
Os primeiros cristãos buscaram nas Escrituras (Antigo Testamento) luzes para entender a morte de Jesus. Uma primeira perspectiva que surgiu foi ver a cruz como o destino de um profeta.[2] Essa explicação é compreensível, pois está baseada na própria tradição de Israel e iluminava as primeiras perseguições vividas pelas comunidades cristãs. Essa explicação unia o destino de Jesus e o destino dos profetas, ao mesmo tempo em que associava também as comunidades a esse destino.
Outro caminho para tentar responder ao “por que Jesus morreu” foi afirmar que a cruz era necessária.[3] Apelou-se em última instância para Deus, para que ao menos em Deus a cruz tivesse sentido. Essa postura parte da honestidade das comunidades de que não se conseguia entender a tragédia que se abateu sobre Jesus e que só Deus saberia dizer algo. Por outro lado, esse discurso mostra a teimosia destas mesmas comunidades em manter a esperança, afirmado que deve haver algum sentido no que aconteceu com Jesus mesmo que não saibamos ou consigamos entender.
Entretanto, se aceitarmos a explicação da cruz apelando para o mistério de Deus, para Sua vontade, ou seja, Jesus morreu porque foi a vontade de Deus, naturalmente surge outra pergunta: POR QUE JESUS MORREU DESSA FORMA E NÃO DE OUTRA?
Essa pergunta se torna importante se lembrarmos que o Deus cuja vontade foi a morte de Jesus na cruz não é qualquer Deus. Tanto para os judeus como para Jesus, Deus é bom, liberta os oprimidos, defende a vida do justo, quer a vinda do Seu reino; é um Deus a quem Jesus chama de “abba” (“painho”). Por isso, o Novo Testamento vai nos apresentar a busca dos primeiros cristãos pelo sentido da cruz na morte de Jesus. Em outras palavras, procura-se responder a uma nova questão: EXISTE ALGO DE BOM NA CRUZ, JÁ QUE ESSE FOI O DESÍGNIO DE UM DEUS BOM?
A resposta formal que geralmente ouvimos quando perguntamos isso a um cristão fiel é que a cruz de Jesus é algo sumamente bom por seus efeitos sobre a humanidade, ou seja, porque pela cruz de Jesus Deus nos salvou. Porém precisamos aprofundar um pouco melhor o sentido dessa afirmação. É preciso esclarecer o que há especificamente na cruz que a torna mediação de salvação e remissão dos pecados, em outras palavras, como pode haver salvação na morte de cruz de Jesus.
Vamos procurar responder a essas questões na última postagem dessa série próxima semana.




[1] Como o objetivo desse blog é desenvolver uma reflexão acessível, não é possível fazer uma exposição densa sobre todos os pontos desse tema. Porém, coloco a seguir uma lista bibliográfica a partir da qual essa reflexão se desenvolve. Fica a dica para a pesquisa dos leitores e leitoras:
- BARBAGLIO, Giuseppe. Jesus, hebreu da Galileia: pesquisa histórica. São Paulo: Paulinas, 2011.
- HORSLEY, Richard A.; HANSON, John S.. Bandidos, profetas e messias: movimentos populares no tempo de Jesus. São Paulo: Paulus, 1995.
- REICKE, Bo. História do tempo do Novo Testamento. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2012.
- SCARDELAI, Donizete. Movimentos messiânicos no tempo de Jesus: Jesus e outros messias. São Paulo: Paulus, 1998.
- SEGUNDO, Juan Luis. A história perdida e recuperada de Jesus de Nazaré: dos sinóticos a Paulo. 2ª ed. São Paulo: Paulus, 1997.
- SCHILLEBEECKX, Edward. Jesus, a história de um vivente. Tradução: Frederico Stein. São Paulo: Paulus, 2008.
- SCHNEIDER, Theodor (Org.). Manual de dogmática – v.I. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
- STEGEMANN, E. W.; STEGEMANN, W. História social do protocristianismo: os primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Paulus, 2004.
- SOBRINO, Jon.  Jesus, o libertador: I – A história de Jesus de Nazaré. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1992.
- THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2004.
[2] 1 Ts 2,14s; Rm 11,3; Mt 23,37; Mc 12,2s.
[3] Lc 24,26; Mc 8,31; At 2,23; 4,28.

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