domingo, 8 de abril de 2018

Por que mataram Jesus? Por que Jesus morreu? (Parte II)

Julgamento no Sinédrio
Ao olharmos para a morte de Jesus nos deparamos com duas forças que se movimentam para levá-lo a morte: as autoridades religiosas e o poder político romano. Isso aparece quando observamos os dois processos pelos quais Jesus passa antes de ser morto crucificado.
Jesus é morto mediante dois julgamentos: um religioso e outro político.[1]
O julgamento religioso ocorre porque Jesus entra historicamente em conflito com os líderes religiosos de seu tempo e, por isso, será também condenando teologicamente em nome de Deus. Ele foi acusado de blasfêmia e de ameaçar destruir o Templo,[2] porém ao examinarmos melhor como Jesus desenvolveu seu ministério, parece ser mais sensato concluir que os membros da casta sacerdotal estavam irritados por ver que Jesus se erigia em reformador religioso dos usos cultuais vigentes em seu tempo, questionando a posição e a interpretação oficial.
Jesus diante de Pilatos
No julgamento político, Pilatos vê em Jesus um líder popular que, como outros, poderia começar um levante e isso o tornava uma ameaça. Os Evangelhos tratam desse processo político de forma mais “branda”, quase que aliviando a responsabilidade do poder político romano sobre a morte de Jesus,[3] porém os dados históricos sobre a administração de Pilatos na Judeia permitem conhecer um personagem diferente do que aparece nos Evangelhos. Pilatos era duro e rápido em reprimir qualquer suspeita de rebelião. Ele não distinguia entre movimentos armados ou movimentos proféticos populares como o de Jesus. Para ele todos poderiam ser movimentos de oposição ao domínio romano e, portanto, uma ameaça de revolta popular.
As acusações que os Evangelhos apresentam no processo de Jesus diante de Pilatos permitem entrever como as autoridades romanas viam qualquer movimento suspeito: como algo politicamente perigoso, com discursos subversivos, e como uma possibilidade de rebelião contra a dominação romana.
O que confirma essa perspectiva do julgamento político é que Jesus morre crucificado como um malfeitor político. Morre com o tipo de morte que só o poder político romano podia dar. O tipo de morte que era aplicada àqueles que eram considerados uma ameaça para a ordem política romana.
Por que mataram Jesus? Por seu tipo de vida, pelo que disse e pelo que fez.
As autoridades religiosas e a aristocracia judaica julgaram e mataram Jesus em nome de Deus, em nome da daquilo que eles achavam que era a vontade de Deus, para manter a pax romana controlando todo e qualquer movimento que pudesse se tornar problemático, para manter o status da religião que lhes garantia poder e prestígio.
O poder político também julgou e matou Jesus em nome de seu “deus”, o imperador César, porque seu movimento foi identificado como potencialmente perigoso, para evitar qualquer possibilidade de problemas com o seu grupo, enfim, por ele ser considerado “inimigo de César”.
A morte de Jesus não foi um erro. Ela foi consequência de sua vida. E a vida de Jesus foi consequência de sua encarnação concreta, ou seja, ele encarnou-se em um mundo e em uma história que geram exclusão e morte. Ao tomar partido em defesa das vítimas desse mundo e dessa história, ele assumiu as consequências.
Jesus foi morto porque ele incomodava com suas ações e com sua palavra. E quando alguma coisa incomoda logo procuramos um jeito de nos livrarmos dela!
Foi por tudo isso que mataram Jesus!
Resta-nos ainda outra questão: por que Jesus morreu?
Vamos continuar falando sobre isso na próxima postagem.




[1] Como o objetivo desse blog é desenvolver uma reflexão acessível, não é possível fazer uma exposição densa sobre todos os pontos desse tema. Porém, coloco a seguir uma lista bibliográfica a partir da qual essa reflexão se desenvolve. Fica a dica para a pesquisa dos leitores e leitoras:
- BARBAGLIO, Giuseppe. Jesus, hebreu da Galileia: pesquisa histórica. São Paulo: Paulinas, 2011.
- HORSLEY, Richard A.; HANSON, John S.. Bandidos, profetas e messias: movimentos populares no tempo de Jesus. São Paulo: Paulus, 1995.
- REICKE, Bo. História do tempo do Novo Testamento. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2012.
- SCARDELAI, Donizete. Movimentos messiânicos no tempo de Jesus: Jesus e outros messias. São Paulo: Paulus, 1998.
- SEGUNDO, Juan Luis. A história perdida e recuperada de Jesus de Nazaré: dos sinóticos a Paulo. 2ª ed. São Paulo: Paulus, 1997.
- SCHILLEBEECKX, Edward. Jesus, a história de um vivente. Tradução: Frederico Stein. São Paulo: Paulus, 2008.
- SCHNEIDER, Theodor (Org.). Manual de dogmática – v.I. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
- STEGEMANN, E. W.; STEGEMANN, W. História social do protocristianismo: os primórdios no judaísmo e as comunidades de Cristo no mundo mediterrâneo. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Paulus, 2004.
- SOBRINO, Jon.  Jesus, o libertador: I – A história de Jesus de Nazaré. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1992.
- THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2004.
[2] Blasfêmia: cf. Mt 26,64; Mc 14,62; Lc 22,67; Jo 10,24. Sobre o templo: cf. Mt 26,61; Mc 14,68; Jo 2,19.
[3] Muitos estudiosos entendem que essa atitude presente nos Evangelhos reflete o contexto da época em que estes foram escritos. Seus autores (que escreveram entre os anos 60 e 90 d.C. os Evangelhos) teriam procurado evitar polemizar com as autoridades romanas, pois as comunidades já estavam sofrendo represálias da parte poder romano. Entretanto, documentos da época e a obra de Josefo oferecem interessantes informações sobre a personalidade e as ações de Pilatos na Judeia entre os anos 26 e 36 d.C. que nos permitem sustentar essa linha de pensamento.

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