Uma imagem significativa dentro
das celebrações da Semana Santa é a de Jesus entrando em Jerusalém aclamado
pelos seus discípulos e por uma multidão[1]
que, tomando ramos nas mãos e os seus mantos para colocá-los pelo caminho por
onde ele estava passando em sinal de reverência, gritavam “hosana ao filho de
Davi”. Isso se dava porque Jesus estava sendo visto como o Rei messiânico
prometido, que viria libertar Israel de sua opressão.
Entretanto, a aparente
pomposidade da cena é quebrada pela forma como Jesus se apresenta. Ele entra em
Jerusalém em meio às aclamações não em uma carruagem real, não em um possante
cavalo de guerra, mas montado em um jumentinho.
Essa imagem é provocativa para
todos nós ainda hoje, pois ela nos revela como a “lógica de Deus” é diferente
da nossa forma de pensar e compreender as coisas.
Sempre que medito cenas como
essa, presentes nos Evangelhos, me chama a atenção como a Palavra de Deus nos
provoca a repensarmos a forma como olhamos e entendemos a vida ao nosso redor.
Vivemos em um mundo no qual a
imagem é mais valorizada do que o conteúdo. Uma sociedade das redes sociais em
que postamos fotos de nossa “felicidade”, de nosso “sucesso”, no desejo de
obter os “louvores” das outras pessoas por meio de suas “curtidas” e
comentários. Muitas vezes essas imagens não correspondem à realidade, mas
apenas produzem uma ilusão de realidade para quem está vendo e uma falsa
sensação de sucesso para quem está sendo visto.
O desejo de obter o prestígio e
a admiração das pessoas muitas vezes dita a forma como construímos nossas
relações. Muitas vezes caímos na tentação de procurar nos apresentar passando
uma imagem de “grandeza”, de destaque, para garantirmos o reconhecimento e os
aplausos que desejamos.
No Evangelho Jesus parece ir na
contramão de tudo isso ao entrar montado em um jumentinho na cidade de
Jerusalém. Apesar de ele estar sendo aclamado como um Rei, apresenta-se em uma
montaria dos pobres, dos camponeses viajantes, sem pompa, sem glórias
aparentes. É um contraste diante da euforia que o cerca. Porém, parece-me que o
Evangelho está querendo nos fazer pensar sobre alguma coisa...
Esse contraste nos convida a
pensar sobre como é fácil nos iludirmos com nossos desejos de poder e de
grandeza. Mesmo Jesus manifestando que ele é um “rei diferente” ao montar um
jumentinho, a multidão esperava dele uma revolução contra os opressores
romanos. Entretanto, como ele não correspondeu a essa expectativa foi tomado
por um impostor e abandonado pela mesma multidão à morte na cruz.[2]
A lógica de Deus que o Evangelho
nos apresenta é a logica do serviço. É quando nos colocamos a serviço dos
outros, sem busca de glórias pessoais, mas por amor livre e generoso, que
descobrimos o verdadeiro sentido da vida. As “glórias desse mundo” são
passageiras. O que realmente fica é o amor compartilhado por meio do serviço em
favor daqueles que mais precisam, na luta pela justiça, no esforço dedicado à
construção de uma sociedade que seja um dia a Civilização do Amor que Jesus
desejou e pela qual deu sua vida. Montado em um jumentinho, Jesus aponta o
caminho do serviço, não o caminho das “glórias desse mundo”, como o caminho que
gera verdadeiro sentido para nossa vida.
Esse caminho vale para cada um
de nós, mas também vale para as instituições religiosas de forma mais significativa.
Toda religião que não assume o
caminho do serviço, mas que se coloca a serviço de si mesma, em busca de
prestígio e poder, não entendeu o nosso “Rei montado em um jumentinho”. Quando
colocamos as instituições acima das pessoas, acima de sua dignidade, não
entendemos ainda essa cena da entrada de Jesus em Jerusalém.
Corremos o risco de estarmos, na
verdade, distraídos com os ramos, os mantos, os gritos de exaltação, e não vermos
Jesus montado em um jumentinho. Talvez até pensemos que o jumentinho é um
acidente de percurso, que Jesus montou nele porque não encontrou coisa melhor,
que foi um improviso do momento, tudo para não pensarmos no significado dessa
imagem de Jesus sobre o jumentinho.
É difícil não sermos envolvidos
pelo contexto cultural no qual vivemos atualmente. Cada um de nós,
pessoalmente, assim como as nossas Igrejas, não estamos livres do fascínio dos
aplausos, dos elogios, da busca por poder e prestígio. Somos incentivados de
várias maneiras a buscar isso como sinal de realização e felicidade.
Entretanto, a mensagem que vemos no Evangelho pode nos ajudar a discernir
melhor nossas escolhas e atitudes, e nos ajudar a ir na “contra-mão” dessa
lógica da imagem e do poder.
Contemplemos essa cena que o
Evangelho nos oferece nesses dias! Deixe-mo-nos questionar por ela! Olhemos
para Jesus, nosso Rei, montado em um jumentinho e aprendamos com Ele o caminho
do serviço como o verdadeiro caminho que nos fará “grandes no Reino dos Céus”.[3]