Pintura Traição de Judas e Pedro fere o servo Malco |
Esta semana que termina foi
muito intensa!
Começamos com o terror do
incêndio que destruiu o Museu de História Natural do Rio de Janeiro, destruindo
obras e materiais insubstituíveis no que se refere à história, à pesquisa
arqueológica, à memória, à arte. Por outro lado, terminamos a semana com o
trágico atentado contra a vida do candidato a presidência, Jair Bolsonaro,
durante uma caminhada no interior de Minas Gerais, perpetrado por um rapaz que
parece ter uma posição política radical e oposta à do candidato.
Esses acontecimentos, um abrindo
a semana e o outro praticamente fechando a semana, me fizeram pensar um pouco
sobre o que estamos vivendo no Brasil e o que podemos dizer, à luz da mensagem
cristã, diante desse quadro...
O povo da Bíblia tem como uma de
suas fortes características o “fazer memória”, o recontar para conservar,
valorizando seu passado e tomando dele o significado e sentido para viver o
presente e olhar para o futuro. A celebração da Páscoa Judaica, por exemplo,
tem a bela característica de fazer presente o passado do seu povo, recordando
sua história de escravidão, sofrimento e de como Deus agiu em seu favor. Desse
modo, o povo conserva sua memória e anima sua esperança em Deus como aquele que
sempre caminha com seu povo.
Guardar a memória não é um
capricho, ou uma questão de valor artístico de algo. Guardar a memória é
garantir a identidade, é saber de onde viemos, quem somos hoje e o porquê somos
assim hoje, em que acertamos e em que erramos pelo caminho já percorrido, para
podermos olhar para o futuro e vermos o que poderemos ser, o que deveremos
evitar, o que aprendemos com os erros cometidos, em que precisamos mudar para
amadurecermos.
A destruição do museu é um símbolo para todos
nós, um convite para não deixarmos que a nossa memória se perca, pois jamais
seremos um povo realmente unido, fraterno, justo, que promove a vida e a
dignidade das pessoas, se não tivermos memória do nosso passado, da nossa
história. Facilmente cairemos nos mesmos erros já cometidos, escolheremos os
mesmo caminhos tortos e confusos da violência e da opressão como meios para
solucionar nossos problemas como país, esquecendo que esses caminhos jamais
promovem o bem das pessoas.
A violência sofrida pelo
candidato, já quase no final da semana, é o sinal simbólico do que afirmamos
acima. Alguém acha que com violência se pode resolver o problema que lhe
incomoda e parte para o ataque. Discursos de ódio e teorias da conspiração tem
ganhado terreno nas redes sociais. Não se discute o que é mais simples e
evidente: uma vida humana foi ameaçada pela intolerância, mesmo que tenha sido
a vida de alguém que tem um discurso violento e intolerante.
Nos evangelhos é abundante a
presença da temática da tolerância e do respeito. Gosto especialmente quando
recomenda “pagar o mal com o bem” (cf. Rm 12,21; I Pe 3,9). Acho ousadíssimo
esse conselho evangélico, difícil diante do nosso instinto de vingança
revestido de uma roupagem de “justiça”. Jesus ensinou com a própria vida isso!
Ele foi duro em algumas ocasiões, discutiu e atacou aqueles que faziam oposição
a sua mensagem, mas nunca fechou-lhes as portas do diálogo, nem incentivou
ninguém a matar em seu nome ou a usar de violência para defendê-lo. No episódio
de sua prisão, quando Pedro puxa uma espada (um discípulo armado!!) para
defender a vida de Jesus, o próprio Jesus o repreende afirmando que “quem vive
pela espada, perece pela espada” (cf. Mt 26,51-52; Jo 18,10-11).
Não podemos, como cristãos,
entrar nessa dinâmica de desrespeito pela nossa memória como povo e de
acreditar que a violência é o único caminho para resolver os problemas que
enfrentamos atualmente em nossos pais. A nossa atitude deve ser a da
misericórdia, da justiça, do amor fraterno, da luta pela dignidade humana,
assim como Jesus fez e ensinou.
Cada um de nós teremos, durante
nossas breves vidas nessa existência, difíceis decisões a tomar, posturas a
assumir, escolhas a fazer. Não há opção de vida que não tenha consequências
para nós mesmos e para todos os que nos cercam. As escolhas de Jesus pelos
pobres, pelos pecadores, pelos pequeninos, em fim, por aqueles que eram tidos
por “gente má” pelas classes dominantes de seu tempo, essas escolhas tiveram
consequências em sua vida: perseguição, calúnias, exclusão, violência contra
sua vida. Entretanto, no devido momento, o Pai dá a resposta e coloca Jesus no
posto de Senhor e Juiz da história, tornado-o um escândalo para os que o
rejeitaram e perseguiram e um sinal de salvação para os que creram nEle e se
deixaram transformar em suas vidas.
Esses dois acontecimentos tem
revelado, nesses dias, o que há de escondido em muitos corações e,
infelizmente, parece que ainda temos nos deixado levar pelos caminhos da
indiferença, do descaso, do ódio e da vingança.
Mantenhamos viva a nossa
memória, defendamos nossas riquezas históricas, culturais e artísticas, pois
elas nos garantem o amadurecimento de nossa identidade como pessoas e como
nação. Defendamos a vida e o direito de viver, independente de nossas simpatias
e antipatias, mesmo que seja a vida de alguém que pode, potencialmente, ser uma
ameaça para a nossa, pois a vida é um dom precioso.
Procuremos novos
caminhos iluminados pela Boa Notícia de Jesus!