Estamos
entrando em ano de eleições, mas o temário político ocupa o centro das atenções
desde 2015 com todos os processos, condenações, denúncias, detratações e
manifestações que vem acontecendo. Por isso, nesta semana estou compartilhando
com você minhas inquietações sobre esse contexto. Não é uma postagem específica
sobre teologia, mas é um tema que penso movido pela minha fé que deseja que “todos
tenham vida e vida em plenitude”.
Observando
como as pessoas têm se posicionado nas redes sociais e pensando um pouco sobre
tudo isso, cheguei a uma encruzilhada: não sei mais o que é esquerda e direita
na política brasileira! Não fiz uma pesquisa profunda sobre essa situação, mas
usando um pouco do que conheço de história, quero compartilhar com você o que venho refletindo sobre isso.
Na década de
80 e meados da década de 90 do século passado, essas categorias eram mais ou
menos assim entendidas: Quem defendia a ditadura militar, o capitalismo, os
privilégios das classes ricas da sociedade era definido como alguém de direita.
Já quem defendia o trabalhador explorado, o socialismo, a distribuição de
renda, os direitos sociais e a democracia era tido como de esquerda (havia
também variações como centro-direita ou centro-esquerda, mas isso não faz muita
diferença para essa reflexão). Tenho na lembrança essas imagens. Desse modo, o
termo “partido de direita” foi identificado com a injustiça e o mal, e “partido
de esquerda” com justiça e com o bem.
Por que
apresento essa pequena contextualização? Porque atualmente essa ainda tem sido
a forma de definir, mesmo com certo grau de inconsciência, esses termos. E as
pessoas tem se xingado mutuamente usando esses termos: “você é um direitista
explorador e assassinos de pobres”; “seu esquerdista comunista, terrorista”.
Latifundiário é “direita”, reforma agrária é “esquerda”; heteronormatividade é
“direita”, sexualidade plural é “esquerda”; pensamento do tipo “direitos humanos
é pra proteger bandido” é “direita”, defesa dos direitos humanos é “esqueda”;
etc. Eu entendo que em um contexto passado no qual existiram governos
totalitários que exploravam os trabalhadores se cunhou essa distinção, ou seja,
quem estava explorando no poder foi identificado por esta expressão “a direita”
e os que lutavam pelas mudanças sociais e pelos direitos dos trabalhadores
ficou como “a esquerda”.
Entretanto,
nos lugares em que a chamada “esquerda” assumiu o poder (recordo aqui a antiga
União Soviética, Cuba, Alemanha Oriental) com um sistema socialista (ou
comunista) de governo, também injustiças, exploração, desigualdades, totalitarismos,
desrespeito aos direitos humanos aconteceram. Por isso, tenho tido dificuldades
de entender essas categorias no modo como elas são usadas no contexto atual.
Tenho a impressão de estar diante de um contexto maniqueísta[1] em
que as pessoas só conseguem enxergar duas possibilidades, dois lados: o bem e o
mal, o certo e o errado, o justo e o injusto. Como se fosse fácil estabelecer
as linhas e os limites para definir essas coisas. O pior, ao meu ver, é que
cada lado acredita piamente que é o certo, o bom, o justo.
Sinto falta
de clareza nos discursos para deixar visível qual projeto ou ideologia se está
propondo para a sociedade nesse campo de discussão política. Tenho a impressão
de que o discurso dos partidos e grupos políticos (seja de direita ou de
esquerda ou sei lá de qual) tem se moldado ao “IBOPE” do que seja mais
interessante para ganhar mais votos. Isso é muito ruim porque, no final, não se
tem identidades nem ideologias nem projetos claros a oferecer para que a
sociedade como um todo possa se posicionar, possa escolher, possa discutir.
Todos dizem que querem o melhor para o povo, todos dizem que precisa cuidar da
saúde, da educação, da economia. Apresentam discursos e projetos genéricos, em
sua maioria, não permitindo identificar com clareza de onde eles nascem (ideologicamente)
nem para onde eles vão levar.
Para tentar
fugir dessas categorias “esquerda” e “direita” outras expressões foram
surgindo, “progressistas” e “conservadores”, mas continuando ainda a ideologia
que identifica os “conservadores” com o “mal” e os progressistas com o “bem”.
Essa confusão
tem favorecido o surgimento de discursos políticos fundamentalistas de tendência
totalitarista nas diversas posições. Também tem crescido grupos favoráveis a um
governo militar (pra botar ordem na casa), assim como grupos anarquistas.
Sou a favor
da diversidade política, mas ela só é sadia se os discursos e propostas forem
claras, fundamentadas numa ideologia identificável, que permita o debate. No
momento, isso tudo me parece confuso e complicado.
Não tenho uma
resposta para oferecer sobre tudo isso, ao contrário, compartilho com você
minha inquietação (que talvez não seja a sua). Estou ainda buscando entender
tudo isso, porque os discursos se acaloram e as posições se extremam nas redes
sociais como se pudéssemos resumir a realidade a “dois times”, do bem e do mal,
ignorando a complexidade da subjetividade humana, das relações sociais, das
implicações do que fazemos que se desdobram no tecido social com inúmeras
possibilidades de resultado.
Acredito que
essas categorias “direita” e “esquerda” precisam ser revistas. A forma como
classificamos os grupos e partidos parece não mais expressar suas posições
ideológicas e isso confunde a cabeça das pessoas. Precisamos de uma reforma
política profunda, que vá além dessa pífia “reforminha” que foi feita ano
passado. Espero que nossa consciência política possa sair mais amadurecida
depois de todo esse processo e que possamos, como cidadãos, contribuir
ativamente para as mudanças necessárias.
[1] O
maniqueísmo é uma filosofia religiosa sincrética e dualística fundada e
propagada por Manes ou Maniqueu, filósofo cristão do século III, que divide o
mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou o Diabo.